E quem disse que não temos um superpoder?




                Se fossemos super-heróis ou super-heroínas em um mundo de fantasias, certamente nossos superpoderes seriam a capacidade de alterar o humor das pessoas, de fazer acreditarem em coisas que não existem, de tornar mentiras verdades, capazes de fazer pessoas sacrificarem suas vidas por algum ideal, até mesmo de fazer com que uma nação acredite que somos necessários: Poderes Psíquicos! Hmm, mas espera um pouco... Mas isso já acontece, não? Ok, sem a parte dos poderes psíquicos rsrs. Como assim? Bom, isso já acontece o tempo todo porque a ferramenta que permite esses tipos de influências está presente desde antes do nosso nascimento: a linguagem. Ela permite a comunicação intersubjetividade com o mundo (e com o nosso próprio mundo de ideias) e a nos posicionarmos frente às diversas questões da vida, que só existem porque nomeamos essas questões como “Questões”. Obtemos direções e somos influenciados por ela.

                Podemos dar um exemplo sobre a capacidade de sermos influenciados com a confusão política em que vivemos. Ouvimos discursos e defesas que beiram ao absurdo. São escanda-los que refletem a corrupção, uma atrás da outra. E uma das coisas que chamam a atenção é a capacidade argumentativa apresentada por parlamentares para se defenderem, negarem ou acusarem outras pessoas. Diga-se de passagem, eles fazem muito bem isso – certo, nem todos.  No fundo sabemos que muitos estão apenas tentando garantir convencer a outros de sua “inocência”, mas ainda assim possuem um discurso forte o suficiente para confundir.  

                É impressionante como, não somente no campo da política, mas em qualquer meio a Palavra reflete de um jeito poderoso. Não, não vou falar de política. É outra coisa. Mesmo porque somos influenciados por vários meios, como por propagandas. Dizem que Steve Jobs foi inteligente por fazer com que criássemos a necessidade por algo que não existia (o que é um paradoxo começar a ter necessidade por algo que não faz parte da nossa vida: vide celulares hoje em dia). O que quero dizer é que somos marcados pela palavra a tal ponto que ela reflete sobre nossa personalidade e nosso corpo.

 Vamos por em prática um exemplo. Raramente alguém que venha a ler esse texto não tenha passado pela seguinte situação: Você conhece uma pessoa e com o tempo desenvolve um grande carinho por ela. Depois de um período em que se desbravou conhecer mais intimamente essa pessoa, onde foram permitidos beijos, abraços e sexo, entre tantas outras ofertas, ela te oferece algo a mais, uma das frases mais emblemáticas de um filme romântico: “Eu te amo”. E você, reconhecendo que existe um grande afeto por essa pessoa, que algo lhe mexe quando se encontram e uma falta constante e crescente se apresenta quando essa se despede, se aquece ao ouvir isso, e lhe retribui com palavras e gestos, muitas vezes traduzindo simplesmente um “Eu também”. Ainda que tenham sido apenas poucas palavras, não é a mesma coisa que ouvir: “Hoje temos promoção de torneiras pela metade do preço!”. O exemplo é forçado, mas tem um propósito (talvez além da tentativa boba de gerar alguns risos rsrs). Mostram que palavras podem causar tanto uma excitação e acolhimento, quanto simplesmente indiferença. Mas no fundo, são só palavras. Como é possível que dependendo daquilo que se é dito tenha tamanho impacto sobre nós?

                Podemos dizer que somos seres que se diferenciam dos outros animais pela capacidade de gerar uma linguagem, de sermos capazes de discernir, pelo som, aquilo que supostamente outra pessoa quer nos dizer. Supostamente, pois ainda que exista a clareza de qual palavra foi dita, isso não reflete no real entendimento dela, que depende de um contexto muitas vezes para ser compreendido, basta usarmos alguma palavra que tenha um conceito figurado para compreendermos que a palavra em si não carrega apenas seu sentido em particular, mas algo a mais, que algumas vezes é até difícil de ser substituído por outra palavra. Às vezes a própria entonação é que defini o significado que se quer passar. Por exemplo, caso alguém leve um grande susto, não é difícil de conhecermos alguém que irá responder “Jesus!”, “Meu Deus do céu!”, “Minha nossa Senhora!”, mas essas expressões muitas vezes não encontram sentido nesses momentos que não para expressar um susto. Ou será que de fato se pensa nessas imagens religiosas no exato instante do susto? Para essas pessoas, substituir essas palavras por outras pode ser um belo exercício de possibilidades. Uma curiosidade a parte aqui é que a psicanálise vai dizer que o inconsciente só existe porque existe linguagem, pois esta está inserida no campo do simbólico. Logo, outros animais não possuem inconsciente. Mas... continuemos.

                O fato é que a palavra marca nosso psiquismo de tal jeito que vai para além de seu significado. Ele pertence ao campo de um simbólico maior do que a superfície que ele toca. Nós já estamos inseridos nele, muito antes de nascermos. Já em gestação somos nomeados, somos esperados, supõem-se uma personalidade: “Será que ele(a) vai gostar disso como você?” etc. Nossas palavras só tem sentido porque existe uma cadeia subjetiva que permite a conexão com o sentido de outras palavras. Uma frase só tem sentido por se entender individualmente seus elementos que se conectam. E o mais impressionante disso é que as pessoas se transforam e amadurecem por elas. Não é impressionante pensar que existe uma profissão chamada de psicologia em que sua ferramenta de trabalho, diferente das outras, seja a palavra? E mesmo assim, por mais que nos faltem bisturis, não acontece às vezes um psicoterapeuta fazer uma incisão perfeita sobre um pensamento e que gera mudança? Bem, você pode não ter passado por essa experiência, mas isso é uma informação mais do que concreta. Acontece! Não é difícil alguém que tenha passado por uma psicoterapia não se identificar com esse tipo de experiência.


                 A palavra é o nosso superpoder. Com ela influenciamos os outros e somos influenciados. Com ela nos construímos como pessoas melhores ou piores. É por conta dela que criamos angústias e medos, mas também felicidades e prazeres. O caos e a ordem. E inventamos o antagonismo das coisas, mesmo ele não existindo originalmente.


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