O “Complexo da Mãe Morta” na relação com a depressão infantil.



A relação da mãe com a sua criança parece um enigma de amor. Muito se ouve sobre o intenso laço entre uma mãe com seu pequeno (menino ou menina); como ela pode defendê-lo das mais terríveis situações, às vezes até com a própria vida. Mas esse amor enigmático às vezes fica em dúvida para a criança quando sua mãe parece não estar tão presente como ela esperava.
Diferente do que aparenta dizer o termo “Complexo da Mãe Morta”, conceito empregado pelo psicanalista André Green, não se trata de fato de uma mãe que morreu, de uma morte real. Essa expressão, na verdade, é uma analogia que o psicanalista emprega como uma forma do agir de uma mãe viva, atuante, que toma decisões e oferece algum cuidado ao seu bebê/criança, mas que aos olhos desse, ela está como que constantemente ausente, ainda que ali. Essa analogia se refere ao fato da mãe, por um motivo depressivo, ter se afastado afetivamente da sua relação com seu filho ou filha, deixando de lhe investir a atenção, ainda que ofereça alguma, pois se encontra em uma situação que não consegue dar conta do que a deprimi ou de um estado que tenha que lidar com um sofrimento profundo. E essa falta de investimento afetivo; a apresentação de uma depressão; o luto que aparece por algo significativo, estabelece uma ausência latente na relação mãe-bebê, o qual é como se a mãe não conseguisse assumir seu papel como tal, e se fechasse para suas próprias questões pessoais, ainda que exista um ser que lhe peça e necessite constantemente de sua presença. É nessa analogia de uma mãe presente, mas que afetivamente encontrasse ausente, que Green se refere ao Complexo de Mãe Morta. Uma mãe morta psiquicamente.
Essa relação de falta de interesse pelo bebê/criança acaba afetando diretamente a mesma, que acaba por acreditar ser responsável pelo desinteresse da mãe. Ainda pequena, ela procura dar sentido frente à mãe, que para ela é uma extensão de si. Com o passar do tempo, se o estado da mãe permanece o mesmo, a criança cresce em um ambiente com um amor duvidoso, de pouco acolhimento, e se vê gradativamente acreditando que o mundo da mãe (suas reclamações, sua falta de interesse pelas coisas, sua insatisfação constante etc) é de fato o que ela mesma (a criança) pode vivenciar como sendo o que esse mundo lhe oferece. A criança, então, pode se tornar depressiva com o tempo, numa identificação com a postura da mãe.   
Mas longe de pensar que essa depressão vá apenas até a adolescência e simplesmente desapareça, pois a base de uma construção subjetiva e estrutural dá-se na infância. O adolescente e posteriormente o adulto podem acabar por carregar essa impressão de mundo por toda a vida, uma vez que não perceba e não consiga distinguir a sua realidade de existência como consequência de um estado materno, uma visão de mundo pelo desinvestimento amoroso de uma figura vital. A criança necessita de uma base (materna) para se estruturar no mundo afetivo, e uma vez que ele se encontre fragmentado, esse mundo de amor, é como se as vigas de sua maturidade estivessem trincadas e pouco resistentes a relacionamentos afetivos com outras pessoas. Podem apresentar dificuldades de amar, por exemplo. O trauma da criança frente a essa situação é um trauma narcísico, pois se refere a seu eu, sua existência.
          Pode ocorrer de a mãe deprimir depois de algum tempo de rica felicidade e investimento afetivo na criança, por exemplo, tendo de lidar com o luto de alguém próximo, com uma grande decisão que mudará seu estilo de vida, com questões de nível afetivo familiar, divórcio etc. Isso é algo pode acontecer e que a criança não dá conta de entender naquele período de sua vida. Muitas vezes só quando adulta ela percebe e entende o que foi a sua infância e o que fez sua mãe deprimir. Mas ela também terá que lidar com seu próprio sofrimento. 

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