Pensando
em um quadro geral (não considerando grandes variáveis), nós, enquanto crianças,
temos poucas preocupações, geralmente indo de encontro com formas possíveis que
nos permitam receber o carinho e o amor dos nossos pais e familiares. Também, por que não, pensamos sobre qual
comida gostosa iremos comer no dia, se vai ter alguma sobremesa ou mesmo o que
podemos ganhar de presente no nosso aniversário... Já adolescentes nosso foco
muda, e começamos a pensar e desejar novas experiências sociais e de
relacionamento. Procuramos uma nova identidade que nos represente. Começamos a
explorar o que é o amor de outras formas. A libido ganha um espaço que irá influenciar-nos
pelo resto da vida. A sexualidade é explorada e o objeto de desejo vai ficando
mais claro: seja uma mulher e/ou um homem. E para onde as fantasias podem dai
seguir. Pensamos em como se relacionar bem com as pessoas que nos chama a atenção
e queremos a atenção dessas, e também pensamos como vamos ser vistos pelos
outros. Até mesmo julgados por eles. O
que dizem de nós, seja amigos, conhecidos ou quem for, acaba nos atingindo.
Mas
quando vai se passando o tempo, acima dos 20, 30 anos, nosso foco daquilo que
nos preocupava vai se modificando de uma forma cada vez mais marcante. E a
ilusão de que somos como que eternos vai
se quebrando (pois não pensamos muito nisso quando mais novos). Reconhecemos
mais que o tempo passa. Lembramos que determinado evento aconteceu a 5, 10, 20,
30 anos atrás! Começamos a pensar mais na vida e mais na morte. Nossos
objetivos vão se definindo novamente. E antes o que não era preocupação, as “irresponsabilidades”
– que são normais da idade –, vão perdendo espaço e pensamos: “Opa! Peraí! Já
não posso mais manter esse ritmo”. Isso porque vamos desenvolvendo um foco mais
concreto para nossas vidas, para o tempo que temos. Diferente de quando éramos
adolescentes e não sabíamos bem o que queríamos, agora sabemos mais – mesmo que
às vezes tenhamos dúvidas. Quando adultos nossas preocupações são o que vamos
fazer com nosso tempo, seja viajar pelo mundo, casar, ter filhos, achar algo
que gostemos de trabalhar, abandonar o sistema capitalista e construir uma vida
em área rural ou qualquer que seja a objetivo traçado.
Isso em parte
ocorre, fazendo aqui um amarrado com a teoria psicanalítica, pelo contato com o
Real, termo teórico criado por Jacques
Lacan, sendo parte do estudo sobre o Nó Borromeano.
Mas o que é esse Real? É a mesma coisa que “realidade”? Não é bem isso. Se
pensarmos bem, as pessoas possuem suas próprias concepções de realidade. Como a
que vivenciam pelo contexto financeiro, social, sexual etc que faz parte de
suas vidas. Nesse sentido cada um possui sua própria concepção, mas não é a
mesma para todos. Esse “Real” a que me refiro é algo anterior a uma concepção
de classificações tais como “financeiro”, “social”, “sexual”... O Real é
anterior ao simbólico: ou seja, a linguagem. Se aponto para um objeto e digo
que esse objeto é uma cadeira, ao nomear tal objeto agora ele pertence ao mundo
da linguagem, e todas às pessoas que ouvirem ou lerem a palavra “cadeira” saberão
do que se trata, mesmo não vendo. Como é o caso agora. Vocês não viram a
cadeira que apontei, mas sabem o que é por estarem inseridas no campo da
linguagem. O Real é anterior à nomeação. É o apenas “ser” sem definições do que
é isso que existe (a cadeira antes da nomeação). É o antes da subjetividade que
o classifica (o objeto).
Mas
o que isso tem haver quando falamos do fato de, quando adultos, sabermos mais o
que queremos? O fato é... Algo que é classificado como Real na psicanálise é o “real do corpo”. Não conseguimos fugir
dele. Ele é quem nos mostra que o tempo passa. É como se antes do tempo
(finitude) viesse o corpo, e ao vermos o corpo envelhecer, temos noção do tempo
e que se envelhece. Às vezes o corpo nos apresenta estar doente, em
desequilíbrio, e com essa apresentação, que é, como disse, algo que não
fugimos, temos que aprender a lidar com isso. É “a vida como ela é”. E isso nos trás uma boa dose de angústia.
Mas
ao pensarmos que o tempo passa, que não temos mais aquela liberdade de ser tão “irresponsáveis”
como antes (e fica a critério de cada um entender o que é essa
irresponsabilidade para si), damos um outro norte para nossos desejos. Os
buscamos mais, os identificamos mais e nos preocupamos menos com as opiniões
dos outros, pois sabemos que o corpo está dizendo que o tempo está passando. Aliás,
ao identificarmos mais o que nos interessa, até podemos justamente desejar
sermos “irresponsáveis” dentro do que uma sociedade pode entender como tal,
justamente por perceber que a vida só tem sentido se for assim, mas diferente
de quando se era mais novo, dessa vez tendo mais noção das consequências.
Por
fim, recentemente ouvi um comentário que justamente foi o motivo de escrever esse
texto. Ouvi, em meio a uma discussão sobre a nostalgia do tempo, como os jovens
riem dos mais velhos e os nomeiam com apelidos como “véio”, “idoso (para
pessoas acima de 30 anos)”, “tiozão” etc. Quando chegam nesse ponto uma das
pessoas diz “Jovem é assim, pensa que é imortal. Mas vai chegar um momento que
também ficarão velhos e dirão: No meu tempo não era assim...”. Enquanto
crianças e enquanto adolescentes não pensamos muito na morte, como quando somos
adultos e os anos vão passando. Por conta disso, dar sentido para as nossas
vidas, com o que nos faz viver cada dia, é que torna esse momento tão prazeroso
se aprendermos a aproveitá-lo. Pois um dia todos poderemos acabar dizendo: “no
meu tempo...”.
E eu te
pergunto: O que tem feito com o seu tempo?
PS: Aliás, me parece que temos
uma nostalgia tão gostosa de quando éramos crianças justamente por não termos
noção do que nos esperava (o tempo cobrando seu preço). Pois nessa fase a
intensidade daquilo vivido não tinha o peso do conhecimento do limite que nos é
apresentado com o tempo.
Autor do artigo
Leandro Winter
Leandro Winter
Comentários
Postar um comentário