Duvide de quem é referência e duvide até deste texto





Conversando com uma amiga sobre situações do cotidiano, em um certo momento ela começou a falar de coisas do seu trabalho, e acabamos (não me pergunte como) numa reflexão de como é bom saber o que se passa nos nossos próprios pensamentos, como faz diferença saber algo que buscamos entender. De como temos mistérios em nós mesmos não solucionados. Mistério que às vezes percorrem décadas! E que quando desvendados fazem todo o sentido, e trazem com isso mudanças significativas na nossa vida.

Em determinado momento, essa amiga se virou e comentou sobre querer justamente explorar questões mais íntimas da sua história, e que para isso iria fazer...  fazer, aah... “Como que era o nome mesmo?” perguntou ela. “Aquilo que apareceu na novela das 20:00?”. E eu, num momento de surpresa, respondi: Você diz hipnose? “Isso! Hipnose! Na novela parecia que dava tão certo. Acho que vou tentar. Parece que funciona mesmo”. Foi mais ou menos assim. O resultado foi uma discussão logo em seguida.

Não, não é que brigamos. Discutir não quer dizer brigar, mas sim debater sobre algo, ponderar, refletir, esclarecer... Então, o que se seguiu foi que respondi, como alguém preocupado com essa questão na área de saúde mental, o que pensava a respeito.

Existe um problema em querer fazer hipnose? Não. Sinceramente não vejo porque devemos ser privados de uma experiência como essa (para quem tem um interesse). Se é vontade explorar isso, porque não experimentar? O problema não é a hipnose em si, mas sim a confiabilidade de quem a faz. No caso, o que temos nesse episódio da novela é uma profissional, que é advogada e Coach, que apresenta essa possibilidade de hipnose para uma personagem. E por que ela queria ser hipnotizada?  Porque gostaria de entender o que faz ela ter dificuldades nas relações sexuais.

O fato é que, como bem descreveu uma colega minha em um post (espero que ela não me processe), você não procura um açougueiro para fazer uma cirurgia plástica só porque ele sabe cortar carne. Acho que essa frase expressa bastante à gravidade da situação. De modo geral, um psicólogo, psicanalista ou psiquiatra tem formação específica para lidar com questões da mente humana. Fazer um curso que oferece uma noção de como mudar algumas questões na vida de uma pessoa não é, por consequência, adequado para quem está querendo explorar o mais profundo campo do seu ser, e que tenha – como bem se expressa na própria novela – um peso de uma origem traumática.

Achei curioso que algo que escrevi sobre isso dias atrás tenha acabado se voltando para mim dessa forma, com alguém próximo comprando a ideia que foi vendida por uma propaganda.

Então aqui chegamos ao ponto que se trata o título desse texto. O quanto podemos confiar em algo que nos é apresentado por uma grande empresa, por um artista, por uma figura que seria uma referência de qualidade (supostamente), e até mesmo um familiar? O quanto QUEREMOS acreditar que é isso mesmo e não exploramos a veracidade daquilo? Podemos estar simplesmente deixando a responsabilidade das nossas vidas nas mãos de outras pessoas por puro conforto.

Não se trata da hipnose em si, pois existem psicólogos que trabalham com ela e que fizeram uma formação adequada para lidar com o sofrimento e a angústia. Trata-se de se permitir a dúvida. Permitir a possibilidade de que o outro erra, que pode manipular, que distorce, mesmo parecendo confiável.

Agora, você acredita que eu falei com essa “amiga”? Você acredita que ela existe? Você acredita que essa história aconteceu, mesmo? E a resposta é:


Sim, aconteceu! Mas no fundo não faz diferença para você. Não neste caso. Mas quando se trata de algo que avalia a sua saúde de modo geral, seu bem-estar e segurança... Aaah, daí é interessante duvidar um pouco mais. 


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